domingo, 24 de abril de 2016

Burocrata mas poeta

Meu coração não retumba mais,
Bate regularmente, funciona
Quando sentado na poltrona
Leio, sem ânimo, os jornais.

Há muito não leio poesia,
Já deixei de declamar Camões.
Sou poeta da burocracia,
Sou antítese das revoluções.

Burocrata burguês e funcionário
Descontente com o rumo de seu fado.
Paradigma de um homem ordinário,

Sou escravo de um ótimo ordenado,
Sou herdeiro de um velho mundo agrário,
Sonhador e poeta apaixonado.

Amarras

Eu quero me livrar dessas amarras,
Do que é certo, da boa educação.
Desejo rimar pão com alcaparras
E tomar o meu leite com limão.

Não estou nem aí para conversas,
Convenções, bom-mocismo, adestramento.
Sou adepto de crenças controversas,
Praticante do livre-pensamento.

Cara mãe, não verás esse teu filho
Suspirando na ampla solidão
Ou lutando com o dedo no gatilho;

Estará, com luxúria e com paixão,
Mãos inábeis, abrindo um espartilho
E ofegante de calor e de tesão.