quarta-feira, 13 de agosto de 2014

A História do Povo do Sertão

Dedico o poema abaixo a Ariano Suassuna.


Arde o Sol de meu Sangue acaboclado
Sobre a áspera Rocha do meu ser,
Astro escuro tentando se esconder
Sob a Luz do Sertão esbraseado,
Onde o Rio de meu Sangue derramado
Rega o Solo de um mundo endurecido
E ilumina este Abismo adormecido,
Despertando Demônios e Poetas
Que ao gritarem suas Palavras secretas
Dão ao Caos deste Mundo algum sentido.

Sobre o chão pedregoso Sertanejo,
Furioso e brilhando Auri-vermelho,
Paira o Astro terrível que é o espelho
Desse Sangue maldito e malfazejo
De um Poeta infernal, cujo bafejo
Deu alento a uma Raça piolhosa
Que, gerada na vil massa argilosa,
Quis alçar-se à Divina posição.
Anoitece nas terras do Sertão,
Sonha a Raça divina, silenciosa.

São Vaqueiros que vêm em procissão,
Cangaceiros, Poetas e Ciganos,
Cantadores, Profetas e profanos
Andarilhos da seca Imensidão.
Toda a Raça aguerrida do Sertão,
Cor de couro e com armas reluzentes,
Vem com gritos e Aboios estridentes
Tomar posse daquela seca terra,
Contra o Astro terrível fazer Guerra,
Ser na Terra a mais forte de entre as gentes.

Os punhais e chapéus assinalados
Causam medo a quem medo nunca teve,
Sua gesta é com sangue que se escreve,
Seus pudores com sangue são lavados.
São valentes guerreiros encourados
Que um Lampião vem à frente iluminando,
Com seu brilho os covardes assustando
E cegando a coragem do valente.
Há um olho cruel e incandescente
E um que, cego de espinhos, vem sangrando.

Espinhenta é a Terra Sertaneja,
Dura, seca, salobra e pedregosa,
Divindade Tapuia Perigosa,
Onça parda, que ao sol ardente arqueja.
Sente o cheiro do sangue que deseja
Numa pedra coberta de alastrados.
Nessa pedra há desenhos encarnados
Desenhados com sangue de inocentes
Por reis loucos, beatos, penitentes.
Ouve o choro de infantes degolados.

Vou cantando no meio da caatinga,
Aboiando e criando loucos versos.
O sertão é o maior dos universos,
Cangaceiro zangado que se vinga,
Rubro sangue vertido que respinga,
Mas também poesia e mansidão,
Flor de umbu, joazeiro e gavião.
E eu poeta do humano e do sagrado
Vou contando em martelo agalopado
A História do Povo do Sertão.